sábado, 24 de julho de 2010

Princípio da Boa Ordem

    Há alguns axiomas da Matemática Clássica,  não-construtivista, que considera objetos que não podem ser construídos, nem com algoritmo finito nem com algoritmo infinito enumerável. Pode-se pensar que essa abstração seja uma manifestação da “beleza” da Matemática, ou, simplesmente manifestação de temerariedade científica. Em todo caso, parece-me que a consequência dessa abstração não seja muito frutífica, pois não conheço nenhum resultado prático importante decorrente de tais teorias abstratas que não sejam obtidos por matemática construtivista.  Um exemplo é o axioma da escolha, tratado em uma outra postagem. Outro exemplo, tratado a seguir, é o do Princípio da Boa Ordem, tão controvertido quanto o axioma da escolha, lema de Zorn, e outros. Em último caso, esses axiomas controvertidos podem ser inseridos no enunciado de teoremas, segundo a conveniência, sem serem admitidos como axiomas da teoria geral. Ao serem admitidos no corpo de axiomas da teoria geral, passam a definir o que é e o que não é verdade absoluta, e o estrago é total à Matemática que definem. Como mentira bem contada, tem aparência de verdade, sendo válidos para os casos de conjuntos finitos e para o conjunto dos números naturais.

   O Princípio da Boa Ordem afirma que todo conjunto pode ser bem ordenado. Isto significa que para cada conjunto X existe uma relação de ordem R (pode-se pensar na relação de ordem <= da aritmética dos números inteiros, como exemplo) tal que (X,R) é totalmente ordenado (i.e., para todos x,y em X,  xRy ou yRx) e todo subconjunto Y de X contém um elemento minimizante b (i.e., bRx para todo elemento x de Y).

   Por exemplo, o conjunto dos números naturais N= {0,1,2,3,…} é bem ordenado pela relação de ordem <=, menor ou igual. Como  N é limitado inferiormente, todo subconjunto de N contém elemento mímino, que é, em particular, elemento minizante.

   Para conjuntos com cardinalidade mais elevada, não é nada óbvio como se define uma relação de ordem que faça com que esse conjunto seja bem ordenado. Pode mesmo acontecer de não haver nenhum algoritmo finito ou infinito enumerável para a definição de uma relação de ordem adequada para uma boa ordem. Além do mais, considerando-se o conjuntos dos números inteiros Z, com cardinalidade alefe zero, e o operador P, das partes de um conjunto, constrói-se  o conjunto P(Z) com cardinalidade alefe um, o conjunto P(P(Z)) com cardinalidade alefe dois, o conjunto P(P(…(P(Z))…), n vêzes, com cardinalidade alefe n, e assim por diante.

   Outro fato que cabe notar é como a simplicidade da teoria (veja a axiomática ZF a seguir) destoa da complexidade dos teoremas da Matemática Clássica, em especial da Topologia, da Análise Funcional e da Álgebra Abstrata, provados com a sua adoção.

   Axiomática Zermelo-Fraenkel com o Axioma da Escolha, que é uma axiomática padrão da Matemática Clássica:

  (1) Axioma de Existência : Existe um conjunto sem nenhum elemento. (conjunto vazio)

  (2) Se todo elemento de X for elemento de Y, e se todo elemento de Y for elemento de X, então X=Y.

(3) Seja P(x) uma propriedade. Para cada A existe B tal que x pertence a B se, e somente se, x for elemento de A e P(x) (x satisfaz à propriedade P).

  (4) Axioma do Par: Para cada A e B existe C tal que x pertence a C se, e somente se, x=A ou x=B.

  (5) Axioma da União: Para cada S existe U tal que x é elemento de U se, e somente se, x for elemento de A, para algum A elemento de S.

  (6) Axioma das Partes: Para cada S existe P tal que x é elemento de P se, e somente se, x estiver contido em S.

  (7) Existe um conjunto indutivo (I é um conjunto indutivo se 0 está em I, e para cada x em I, S(x)=x união com {x}, o sucessor de x,  também estiver em I).

  (8) Seja P(x,y) uma propriedade tal que para cada x existe um único y para o qual P(x,y) valha. Para cada A existe B tal que para cada x em A existe y em B para o qual P(x,y) valha.

  (9) Axioma da Escolha: Toda coleção de conjuntos admite uma função escolha.

P.S.: Esta e outras axiomáticas podem ser obtidas em qualquer livro de Teoria de Conjuntos. Veja a axiomática GNB.

2 comentários:

  1. Olá Jaime, sou RP de mídias sociais do Insper. Gostaria de lhe enviar um convite para o lançamento do livro Álgebra Linar. Por favor, se puder me retorne no e-mail tycianecvv@insper.edu.br. Grata!

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  2. Jaime Sodré, Saudações ...

    Seu blog é muito bom, já estou lendo os posts retroativos...

    Sobe este post aqui, gostaria de lhe dar alguns exemplos da Matemática clássica e não-construtiva que certos resultados históricos da disciplina foram obtidos com uso do Lema de Zorn,do Axioma da Escolha, da teorias axiomáticas ZF e ZFC, entre outros conceitos desta nova forma de interpretar a Matemática surgida no século 19 e desenvolvida até nossos dias atuais:

    1) O Último Teorema de Fermat (que foi solucionado definitivamente em 1995 por Andrew Wiles) foi resolvido usando o Axioma da Escolha e o Universo de Grothendieck. link deste fato: http://blog.computationalcomplexity.org/2014/01/fermats-last-theorem-and-large.html

    https://rjlipton.wordpress.com/2011/02/03/infinite-objects-and-deep-proofs/

    2) Consequências do Axioma da Escolha na Física:
    link ----> http://mathoverflow.net/questions/27428/does-the-axiom-of-choice-or-any-other-optional-set-theory-axiom-have-real-wo

    outro link ----> https://www.quora.com/Is-the-Axiom-of-Choice-critical-for-the-mathematical-basis-of-any-physical-theory#

    mais um link -----> http://physics.stackexchange.com/questions/43853/does-the-axiom-of-choice-appear-to-be-true-in-the-context-of-physics

    Lamento, não consegui obter resultados de busca em português.

    Desde já grato por tudo, Jaime.

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